#17 Corpas Possíveis, Corpos Sensíveis | Mover (n)o Mundo – Disability Studies e corpos políticos em movimento
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Arte – Rodrigo Sarmento
Por Sheila Bezerra
Instrutora de Ioga e Doutora em Sociologia (UFPE), com Especialização em Dança (UFBA)
A (in)visibilidade da população com deficiência (PCD), exposta nos gestos historicamente dispensados aos corpos considerados “anormais”, explicita a condição de alienação do corpo considerado “normal” não só em relação ao outro, como também (e tão ou mais problematicamente) em relação a si mesmo. Na alienação de si objeta-se (conscientemente ou não) o que há de mais falível – a deterioração natural do corpo em decorrência do envelhecimento e das lesões adquiridas pelos esforços ou acidentes de trabalho, as limitações provisórias ou permanentes derivadas dos pequenos e grandes acasos da vida, dentre outras expressões de nossa inevitável finitude.
A ideia que permeia o presente artigo é de que, se por si só as abordagens de consciência do movimento fazem reverberar outros sentidos políticos sobre o corpo, quando são atravessadas pelos Disability Studies (DS), há uma potencialização de tais sentidos em direção às questões até então consideradas (pelo senso comum) como sendo do interesse exclusivo das Pessoas Com Deficiência (PCD). Trata-se de uma proposição relativa à “refazenda” de si, pelo contato com as questões sobre diferença e identidade apresentadas pelos Disability Studies (DS)[1] e as potenciais consequências políticas decorrentes deste processo.
A (in)visibilidade da população com deficiência, exposta tanto no hiato entre os dados demográficos[2] e efetividade das políticas de inclusão das pessoas com deficiência, quanto nos gestos historicamente dispensados aos corpos considerados “anormais”, explicita a condição de alienação do corpo considerado “normal” não só em relação ao outro, como também (e tão ou mais problematicamente) em relação a si mesmo.
Na alienação de si, que aqui pode ser traduzida, ora por Vida Nua (Agamben), ora por sobrevivencialismo biológico (Zizek), objeta-se (conscientemente ou não) o que há de mais potente e também o que há de mais falível em si mesmo. Diante da biopolítica que, pelo controle do Estado, reduz a vida à sobrevida, ignora-se a provisoriedade do corpo (e certamente o seu devir), assim como a finitude e o envelhecimento (ou declínio corporal) como evidências de tal fim. Por outro lado, pelas “torções deleuzianas” de Foucault, tal como apontadas em Machado[3], pode-se dizer que, no limite do controle, erigem-se micro-espaços de resistência que podem ser caracterizados por processos de desterritorializações ou mesmo reviramentos.
No campo labaniano, a operação de reviramento pode, por exemplo, nos remeter aos movimentos sombrios (shadow movements) de Laban, onde um pequeno padrão, aparentemente não relacionado ao contexto, como os chamados tiques nervosos, os pequenos erros e mal-entendidos, ou os lapsus linguae, trazem o cerne para fora, dizem algo mais que, embora não diretamente relacionado à circunstância, traz para o contexto outros aspectos do sujeito, àqueles que não falam sobre o evento, mas sobre como a maneira de ser de cada um afeta o evento” (MIRANDA, 2008, p. 63).
Negar o declínio corporal é negar tudo aquilo que pode ser considerado como imperfeito e assustador. Ser um exemplar teratológico certamente não faz parte das ambições de uma sociedade “do poder de normalização” (FOUCAULT, 2010; COURTINE, 2008). Pelo contrário, o “monstro” é o modelo a ser evitado. Como diz Jean-Jacques Courtine em História do corpo, “pode-se dizer que o monstro é o grande modelo de todos os pequenos desvios” (COURTINE, 2008, p. 256), sendo assim, o lapsus linguae supracitado é aquilo que se convenciona chamar de erro. Num país em que a eugenia negativa[4] está em suas entranhas, o erro pode ser todo corpo que resiste e se expõe, ainda que haja uma série de fatores articulados para ocultá-lo, simbólica e/ou efetivamente.
O lapsus linguae neste contexto são corpos negros, femininos, estrangeiros, sexualmente “pervertidos” (homossexuais, bissexuais, entre outros), e/ou de deficientes, todos eles compreendidos como corpos abjetos[5], passíveis de manipulação, docilização, invisibilização, negados tanto pelas subjetividades que comportam, quanto principalmente pelo aparato biológico considerado inferior, descabido, inapropriado e, finalmente, indesejado. Diz respeito ao corpo que fissura as fronteiras da normalidade e causa mal-estar. É a vida que não é considerada vida (KRISTEVA, 1982; BUTLER Apud PRINS et al. 2002).
A normalidade, ou a pretensa normalidade que constrói o corpo abjeto, como tudo que lhe opõe, passa a ser questionada quando o exercício está justamente na retomada do “corpo naquilo que lhe é mais próprio, na sua dor, no encontro com a exterioridade, na sua condição de corpo afetado pelas forças do mundo e capaz de ser afetado por elas” (PELBART, 2007, p. 62).
É no sentido da busca pelo corpo passível de afetar e ser afetado que o pressuposto no qual se alicerça o presente artigo pode ser apresentado na seguinte afirmação: uma vez que as abordagens de consciência do movimento sejam atravessadas pelos Disability Studies (DS), pesquisadoras e pesquisadores do movimento (profissionais ou não) estarão potencialmente sensibilizadas(os) para questões que têm sido consideradas, comum e equivocadamente, como sendo do interesse exclusivo das PCD[6], a exemplo, do design universal, da arquitetura acessível, dos ônibus adaptados, da acessibilidade comunicacional e atitudinal, entre outros.
Para a elaboração da ideia supracitada, dois pressupostos se fizeram presentes: um primeiro que, em si mesmas, as abordagens de consciência do movimento (elementos das técnicas de eutonia “dos Alexander” – Gerda e Mathias, das técnicas de Moshé Feldenkrais, Klauss Vianna e Angel Vianna, e das pesquisas em movimento de Rudolph von Laban, e entre suas releituras e/ou aprofundamentos, as de Irmgard Baternieff, Ciane Fernandes e Regina Miranda), já têm um grande potencial de deflagrar transformações em direção, por exemplo, ao Corpo Sem Órgãos – CSO[7], compreendido neste contexto como uma das principais expressões desse lugar de devir. Como segundo pressuposto, coadunamos com Matos (2014, p.20), quando afirma que os DS têm sido reconhecidos como “um novo campo interdisciplinar que busca apreender como fatores sociais, culturais, políticos e econômicos definem a deficiência e a diferença”.
Jean-Jacques Courtine no seu capítulo pertinente à publicação História do corpo (CORBIN, COURTINE & VIGARELLO, 2008), denominado O corpo anormal – História e Antropologia Culturais da deformidade, chama a atenção para as mudanças do olhar sobre o corpo anormal a partir de três momentos históricos: o primeiro diz respeito ao lugar do risível – o corpo exótico ou disforme exposto nas ruas ou nos recintos voltados para diversão; o segundo diz respeito ao corpo anormal no espaço medicalizado da investigação científica – no caso, onde se inaugura o olhar compassivo, em que o anormal é digno de pena e favor; e, finalmente, o lugar do corpo anormal agora reconhecido como capaz social, política e economicamente, detentor de direitos e obrigações cidadãs. Estes momentos coexistem, e ocupam um lugar central nas discussões dos DS, principalmente no que tange às discussões sobre identidade e diferença.
Grosso modo, as PCD têm sido identificadas como grupo a partir de uma abordagem física/médica (ou modelo biomédico) e de uma abordagem sociocultural (ou modelo social) (BARNES, 2003; DINIZ, 2007; JOHNSTONE, 2004; ONU, 2012; SHAKESPEARE, 1996). A questão da identidade no contexto da deficiência é tão complexa quanto nas circunstâncias dos grupos considerados minoritários, a exemplo dos grupos de mulheres, lésbicas e gays, pessoas negras, indígenas, entre outros. Em alguma medida, elas têm suas individualidades subsumidas pelo determinismo biológico que tende a enfatizar as características físicas e um modo normalizador, em detrimento das experiências pessoais com fins de construção de uma identidade política.
Este é o caminho traçado pelo entendimento médico da deficiência, onde há uma focalização na diferença física em relação ao padrão de normalidade do qual as pessoas deficientes desviam (SHAKESPEARE, 1996, p. 95). A questão é que, se por um lado, esta abordagem diferencia tomando por referência um padrão de normalidade, por outro homogeneíza em representações desfavoráveis. Nesse sentido são vistos como incapazes, impotentes, dependentes, vulneráveis, passíveis de melhoramento a partir de intervenções cirúrgicas e outras intervenções médicas, além de uma porção de adjetivos e concepções pouco ou nada condizentes com a realidade das PCD, principalmente se se toma por referência o modelo social da deficiência.
Para o modelo social, a deficiência não pode ser vista como tragédia pessoal, mas sim como resultado das barreiras impostas socialmente e dos preconceitos que limitam a ação de corpos no mundo, sejam eles deficientes, ou de mulheres ou outros grupos socialmente discriminados em muitas instâncias sociais. Atualmente, a partir do Relatório Mundial sobre a deficiência, diz-se o seguinte:
O modelo médico e o modelo social costumam ser apresentados como separados, mas a deficiência não deve ser vista como algo puramente médico nem como algo puramente social: pessoas com deficiência frequentemente podem apresentar problemas decorrentes de seu estado físico. É necessário fazer uma abordagem mais equilibrada que dê o devido peso aos diferentes aspectos da deficiência. A CIF[8], adotada como modelo conceitual para este relatório mundial sobre a deficiência, compreende funcionalidade e deficiência como uma interação dinâmica entre problemas de saúde e fatores contextuais, tanto pessoais quanto ambientais. (ONU, 2012, p. 4).
Para além das abordagens médica e social da deficiência, e até para além da tentativa de superação de tal dualidade, como no caso da abordagem da CIF, existe uma outra perspectiva pautada nos estudos pós-estruturalistas que situa a discussão sobre a identidade da PCD no terreno dos discursos. Esta é, por exemplo, a perspectiva de Tom Shakespeare (1996:108) quando ele referenda o seguinte pensamento de Butler: “Ela descreve identidade como autor representação, como “ficções” que não são nem fixas, nem estáveis”.
Tem sido ponto comum a fundamental “aproximação dos Di sability Studies de outros saberes já consolidados, como os estudos culturais e feministas” (DINIZ, 2007; SHAKESPEARE, 1996). Nesse sentido, e com fins de fundamentação da premissa deste artigo, vale a pena destacar a seguinte passagem de Chantal Mouffe:
A “identidade” de um sujeito tão múltiplo e contraditório é, portanto, sempre contingente e precária, temporariamente fixa na intersecção dessas posições de sujeito e dependente de formas específicas de identificação. Por isso é impossível falarmos do agente social como se estivéssemos a lidar com uma entidade unificada e homogênea. Em vez disso, teremos de abordá-lo como uma pluralidade, dependente das várias posições do sujeito através das quais se constitui em várias formações discursivas, e de reconhecer que não existe qualquer relação prévia e necessária entre os discursos que constituem as suas diferentes posições do sujeito. No entanto, […] esta pluralidade não envolve a coexistência de uma pluralidade de posições do sujeito, mas antes a constante subversão e sobredeterminação de umas pelas outras, que tornam possível a criação de “efeitos totalizadores” num campo caracterizado por fronteiras abertas e indeterminadas. Uma tal abordagem é extremamente importante para o entendimento da luta feminista, bem como de outras lutas contemporâneas”. (MOUFFE, 1996, p.105)
O reconhecimento das diferenças, a consideração das experiências específicas dos corpos, a atenção para as nuanças relativas ao olhar sobre o próprio corpo, estas e outras questões elementares aos Disability Studies (DS) norteiam grande parte das discussões, institucionais ou não, relativas ao tema. De qualquer modo são muitas as interpretações e disputas em torno dos discursos relativos à deficiência, e estas acontecem, certamente, para além da dicotomia entre o modelo biomédico e o modelo social.
O atravessamento das abordagens em movimento por tais perspectivas, próprias aos DS, sugere um fio (quase) invisível que está no entre-lugar do não-ser-“deficiente” e do saber-se não-“normal”. Trata-se, no caso, de um outro lugar elaborado não apenas por elementos empáticos de aproximação com as demandas políticas das PCD, mas pela emergência de entendê-las como próprias.
No atravessamento das técnicas de conscientização do movimento pelos DS, o lapsus linguae está em evidência. O reviramento é exposto e diz de “um evento interno-externo: o que aparentemente estava fora do contexto passa a estar dentro; e o que estava dentro vai para fora. A operação reconfigura a situação anterior, que passa a ser simultaneamente, a mesma e diferente” (MIRANDA, 2008, p. 63), tudo em um só corpo, com experiências únicas e efetivamente singulares.
no jogo que convoca outros sentidos corporais pela imobilização de partes do corpo e sentidos, e pela exposição às mais diversas experiências sensoriais orientadas pelas questões caras aos DS, são reviradas identidades e subjetividades, e entende-se que desse modo o raio de compreensão de si provoca processos concomitantes de subjetivações e dessubjetivações.
No vazio da dessubjetivação que pode ser representado pelo espaço “vazio” do furo central do toro, existe a potência daquilo que poderia ser considerado uma nova biopolítica ou o paradigma de uma biopolítica menor, ou pelas torções deleuzianas de Foucault: micro-espaços de resistência. Ter pernas e ainda assim buscar os acessos de rampa para cadeiras-de-rodas num teatro é, certamente, um modo de mover-se diferente no mundo – um delicado malabarismo sobre fios (quase) invisíveis nas margens dos abismos.
Referências
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BARNES, Colin. Disability Studies: What´s the point? In: Theory, policy and conference. Anais…Lancaster: University of Lancaster, 2003. Notes of a verbal presentation at the Disability Studies. Disponível AQUI. Acesso em 28 Ago 2017.
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Notas de Rodapé
[1] Não há consenso quanto à tradução do termo Disability Studies. A pesquisadora Lúcia Matos utiliza o termo “Estudos da Deficiência” e justifica que não há correspondência em português, visto que nesta língua tem-se apenas o termo Deficiência, o qual em inglês é impairment e é distinto do significado de disability. No caso da pesquisadora Débora Diniz, em seu livro “O que é deficiência” ela traduz como “Estudos sobre Deficiência” e não justifica a sua livre tradução. Neste artigo a escolha será por manter o termo sem correspondência em português.
[2] Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Censo 2010 – o Brasil tem 45,6 milhões de pessoas com deficiência. A deficiência mais frequente é a visual com 35 milhões de pessoas (18,8%) que declararam ter dificuldade de enxergar, mesmo com óculos ou lentes de contato.
[3] Expressão de Roberto Machado no capítulo Foucault e as torções deleuzianas quando remete ao modo deleuziano de pensar que seria “ (…) repetindo o pensamento do outro, com o objetivo de utilizá-lo como instrumento ou como operador, busca não sua identidade, mas a afirmação de sua diferença, devendo por isso comportar a modificação própria do duplo (MACHADO, 2010, p. 181).
[4] Sobre a presença das políticas eugênicas no Brasil ver Lília Moritz Schwarcz, em “O espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e questão racial – 1870 a 1930. São Paulo: Cia das Letras, 1993”, e estudos feministas dos anos 80 relacionados aos direitos reprodutivos das mulheres negras e pobres – principais alvos das políticas de esterilização do governo.
[5] O conceito Abjeto pode ser encontrado tanto em Julia Kristeva (1982), quanto em Judith Butler a partir do Livro Bodies That matter. Para o presente artigo consultamos a entrevista de Butler concedida à PRINS et al (2002).
[6]Segundo Débora Diniz, “Para os percussores dos estudos sobre deficiência, a linguagem referente ao tema estava carregada de eufemismos discriminatórios: “aleijado”, “manco”, “retardado”, “pessoa portadora de necessidades especiais” e “pessoa especial”, entre todas expressões ainda vigentes em nosso léxico ativo. Um dos poucos consensos no campo foi o abandono das velhas categorias e a emergência das categorias “pessoa deficiente”, “pessoa com deficiência” e “deficiente”. Há sutilezas no debate sobre cada uma dessas expressões. Os primeiros teóricos optaram por “pessoa deficiente” e “deficiente” para demonstrar que a deficiência era uma característica individual na interação social”. (DINIZ, 2007, p. 10).
[7] “A imagem que Artaud utiliza quando inventa a expressão “corpo sem órgãos” – no seu programa de rádio “Para acabar com o julgamento de Deus” – fala de dança. Diz: “quando tiverem conseguido um corpo sem órgãos, o terão libertado de seus automatismos e desenvolvido sua verdadeira liberdade/ Então poderão ensiná-lo a dançar às avessas, como no delírio dos bailes populares e esse avesso será seu verdadeiro lugar” (COSTA et al., 2003, p. 58).
[8] A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), substitui Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (ICIDH) cujas ideias estavam pautadas no modelo médico sobre deficiência. No caso, “passou-se de deficiência como consequência de doenças (ICIDH) para deficiência como pertencente aos domínios da saúde (CIF). Os domínios da saúde são descritos pela CIF com base no corpo, no indivíduo e na sociedade, e não somente das doenças e suas consequências, tal como proposto pelo ICIDH” (DINIZ, 2007, p. 48).