“Não estamos desatentos e desarticulados. Todos estão resistindo” | Entrevista – Grão Comum e Gota Serena

Imagens – Divulgação
No dia 03.05, às 20h, o Teatro Hermilo Borba Filho, receberá pa(IDEIA) – pedagogia da libertação, espetáculo dos coletivos pernambucanos Grão Comum e Gota Serena, durante a programação do TREMA! Festival. A encenação tem no elenco Daniel Barros, Junior Aguiar e Márcio Fecher, aborda os 70 dias da prisão do educador pernambucano Paulo Freire no Recife após o golpe de 1964, relata o exílio do professor por 16 anos pela América Latina, Europa e África e narra suas experiências como secretário de educação na cidade de São Paulo.
Quem conversou com o nosso editor-chefe, Márcio Andrade, sobre os gatilhos que envolveram seu processo criativo foi Junior Aguiar, que atua no espetáculo nas áreas de pesquisa, encenação, dramaturgia, atuação e iluminação.
Em H(eu)storia, vocês trabalharam com o imaginário em torno de Glauber Rocha e sua relação com arte, política etc. O que conduziu vocês a uma narrativa sobre a trajetória de Paulo Freire?
A alma do projeto TRILOGIA VERMELHA é projetar as ideias e os fatos biográficos de três nordestinos aclamados no mundo e que juntos promoveram uma mobilização social na arte, na educação e na religião descortinando antigas injustiças, combatendo com vigor velhos paradigmas sociais. São de fato, personalidades revolucionárias. Paulo Freire é o brasileiro mais premiado na história do país, é hoje o patrono da educação brasileira, é um pernambucano nascido em casa amarela, ou seja, é um patrimônio nosso cujas ideias estão fervilhando de atualidade e que precisam, a todo custo e esforço, serem defendidas e projetadas na contemporaneidade desta crise brasileira. Nosso espetáculo é sobre a educação brasileira, sobre o fato dela sempre ter ficado em segundo plano, é um espetáculo sobre ideias, quer a reflexão crítica na busca incansável pelas nossas libertações.
Como foi o processo de construção de dramaturgia e encenação a partir de uma trajetória histórica e documentada. Vocês podem comparar um pouco como fizeram essa construção com a história de Glauber e com a de Paulo?
O espetáculo de Glauber nasce a partir de uma carta que ele escreve para Jomard Muniz de Brito dois anos depois do Golpe de 64. E a estrutura dramaturgica foi contar sua vida linearmente indo do nascimento a morte. Em Paulo, optei por um caminho diferente. Durante a pesquisa descobri que no momento do Golpe de 64 ele estava em Brasília trabalhando na implantação do Plano Nacional de Alfabetização (PNA) e ao retornar ao Recife é preso por setenta dias. Achei essa linha dramaturgica muito interessante, começar já com o Golpe de 64 e ao expor o interrogado do professor, eu recontaria os aspectos mais marcantes de sua atução. A dramaturgia é um turbilhão de referências e citações que costuram e dão contorno a alguns aspectos da vida de Paulo Freire.
O tema que atravessa a o TREMA! Festival em 2016 é (Re)Construção e possui um forte cunho político caldado na nossa crise política e, de certa forma, ideológica. Como vocês percebem as conexões entre essa esfera temática e os espetáculos que vocês produzem aqui em Recife?
Está tudo conectado! Não estamos desatentos e desarticulados, pelo contrario, há agora novas “plataformas” ainda mais autônomas e todos estão resistindo incansavelmente. O tema (RE)construção é muito pertinente e propositivo, porque o cenário é desolador, é de crise mesmo. Espaços fechados, sucateados, sem perspectivas de projeção e mercado, sem estímulos, há é muita dependencia, carência e dificuldade por todos os lados. Aí, aparece um festival como o TREMA! e a gente pensa que a guerra não terminou porque não estamos vencidos, não desalinhamos o vigor dos nossos propósitos como artistas e que é necessário uma renovação de tudo. É fantástico ver Pedro Vilela, Mariana Rusu, Thiago Liberdade agrupando este valoroso conjunto de ideias, colocando recife na rota que há de melhor na produção nacional e criando dialogo com todos nós.