#18 Atos de Retomada | As Teias Abertas da América Latina: Telas, Territórios e Encruzilhadas

Ouça essa notícia
|
Arte – Rodrigo Sarmento | #ADnoTextoAlternativo #4ParedeParaTodes
Por Diogo Spinelli
Integrante dos Clowns de Shakespeare e Crítico do Farofa Crítica

As teias abertas da América Latina. Ato II: meus heróis morreram de overdose ou los nuevos héroes | #ADnoTextoAlternativo #4ParedeParaTodes
Este texto surge a partir da reunião de inquietações e questionamentos advindos do processo de criação – e da realização – da quarta obra estreada pelos Clowns de Shakespeare (Natal/RN) durante o período da pandemia: As teias abertas da América Latina (2021). Antes de chegar à obra, porém, é importante retornar às últimas realizações do grupo, tanto pré quanto durante o período pandêmico, para minimamente contextualizar a pesquisa recente do coletivo potiguar.
Desde a minha entrada no grupo, no ano de 2015, os Clowns vêm se dedicando de forma bastante intensa em fomentar seu projeto pedagógico junto à comunidade, tanto aquela dos bairros de Nova Descoberta (onde estava situado o Barracão Clowns) e do Conjunto Pirangi (no qual está localizado o TECESol, atual sede do coletivo), quanto da cidade de Parnamirim, vizinha à Natal. Nesse sentido, duas ações principais foram iniciadas nesse período.
A primeira delas foi o Laboratório da Cena de Parnamirim, que consistia em uma oficina continuada de iniciação teatral ofertada em parceria com a prefeitura de Parnamirim/RN, realizada até o primeiro semestre de 2019. Já a segunda é o Laboratório da Cena Clowns de Shakespeare, ação que se vincula a outros laboratórios ofertados por coletivos de teatro de grupo da América Latina, e que consiste no compartilhamento da pesquisa do grupo durante duas semanas intensas de criação coletivizada entre os participantes – artistas e estudantes de teatro – subdivididos nas funções de atuação, dramaturgia, direção e produção[1].
Ainda em 2015, o grupo realizou o batismo de seu boi, o Boi Galado, apadrinhado por Helder Vasconcelos e tendo como primo-irmão o pernambucano Boi Marinho. Foi nesse momento que surgiu o interesse por conhecer e aprofundar-se nos festejos populares que também têm em suas brincadeiras a figura do boi. Esse desejo, entrelaçado à perspectiva pedagógica do grupo e à sua pesquisa de mais de uma década sobre o teatro latino-americano, resultou no projeto Boi Vagamundo, apoiado pelo Rumos Itaú Cultural 2017-2018, realizado entre o fim de 2018 e o início de 2020.
Dentre as ações realizadas no projeto Boi Vagamundo, pudemos participar de festejos populares de Peru, Equador e Colômbia, além de ministrar uma versão reduzida de nosso Laboratório nas capitais destes três países[2]. Esses laboratórios foram realizados nas sedes e em parceria com coletivos de teatro locais com os quais já havíamos tido contato anteriormente e gostaríamos de estreitar os laços. Assim, fomos recebidos pelo Grupo Cultural Yuyachkani em Lima, pelo Grupo de Teatro Malayerba em Quito e pelo Teatro del Embuste em Bogotá. Como veremos a seguir, As teias abertas da América Latina é uma reverberação direta desse contato, já que todos os grupos mencionados – acrescidos do boliviano Teatro de los Andes – estão envolvidos de distintas maneiras na realização dessa obra.
Mas, antes ainda, é preciso que passemos por mais uma parte desse percurso: aquela que teve início em março de 2020. Quando os primeiros casos da Covid-19 chegaram ao Rio Grande do Norte, estávamos justamente iniciando os ensaios do que seria nossa próxima montagem, de rua e itinerante, tendo como base todo o material vivenciado em nossas viagens do ano anterior. Após nos darmos conta de que não seria possível a retomada dos ensaios presenciais de forma tão imediata quanto prevíamos – quem, naquele longínquo 2020, não se iludiu com a ideia de que aquela quarentena inicial seria de uns quinze dias, no máximo trinta? – e com a notícia das primeiras experiências teatrais no campo da virtualidade, decidimos também enveredar por esse terreno ainda desconhecido e pouco explorado: o teatro virtual.
Ao longo de 2020 e 2021, nós, do Clowns, optamos por seguir as restrições de contato e as diretrizes de distanciamento social de maneira estrita. Voltamos a nos encontrar presencialmente apenas em setembro de 2021, um ano e meio após o início de nosso isolamento, devidamente imunizados com a primeira dose da vacina, sempre de máscaras e preferencialmente ao ar livre. Assim, todas as três obras que estreamos entre março de 2020 e setembro de 2021 foram realizadas ao vivo, estando cada um dos integrantes do grupo em sua própria residência, em comunicação com o público e entre si através dos mais diversos meios de comunicação.
CLÃ_DESTIN@: uma viagem cênico-cibernética (2020) foi nossa primeira obra cênica virtual. Realizada inicialmente para apenas seis espectadores por sessão, a obra multiplataforma (na qual eram utilizados os aplicativos Zoom, WhatsApp, Instagram e Vimeo) ao mesmo tempo em que fazia uma homenagem ao teatro latino-americano, convocava o público à celebração dos encontros e, em última instância, do próprio teatro como forma de resistência, tendo como base os conceitos de guerra e festa[3]. Já L.A.A.A.T.I.N.A. – Legião de Aventureiras, Aventureires e Aventureiros Tenazes e Incansáveis pelas Narrativas ao Avesso (2021), realizada integralmente pelo Zoom, convidava adultos e crianças a uma jornada pelo continente latino-americano, na qual as narrativas da História oficial, sobretudo aquela vinculada à colonização, eram colocadas em xeque[4].
Por fim, Acatacara: uma peça ao avesso (2021), constituiu-se como uma performance de longa duração, realizada pelo Telegram. Juntos, Clowns e os cerca de 120 participantes/espectadores reunidos em um mesmo grupo, inventamos e vivenciamos coletivamente mais de 600 anos de história de Acatacara, país fictício situado na América Latina. A obra partia da premissa de que nesse país imaginário recorrentemente se realizava um grande ritual de queima, para que a partir do apagamento de sua memória e de sua história, fosse possível ciclicamente reinventar-se.
O mote para Acatacara surgiu tendo como base nossa observação dos crescentes movimentos de repúdio a determinados marcos urbanos e símbolos históricos que vêm eclodindo na atualidade, e de forma bastante acentuada na América Latina. Optamos pela metáfora do fogo ao notar a recorrência deste elemento em distintas ações recentes relativas à memória e à história brasileiras. O fogo se fazia presente tanto em atos de contestação, como no incêndio da estátua de Borba Gato em 24 de julho de 2021 e nas manifestações dos povos indígenas contra a PL 490 em Brasília, quanto de descaso e apagamento, como no caso dos incêndios da Cinemateca Brasileira, ocorrido menos de uma semana depois do de Borba Gato, ou do Museu Nacional, há cerca de três anos. [5]
De certa forma, muitas das questões disparadoras para a criação de Acatacara foram retomadas a seu modo na obra seguinte: As teias abertas da América Latina, contemplada pelo Programa Iberescena de Artes Cênicas 2020/2021. As teias abertas… foi uma coprodução entre os Clowns de Shakespeare e o Teatro del Embuste, de Bogotá/Colômbia, e se constituiu em uma obra híbrida ao alinhavar intervenção urbana, registros audiovisuais e uma dramaturgia desenvolvida para ser acessada exclusivamente pelo público virtual via WhatsApp.
As primeiras conversas sobre As teias abertas… tiveram início ainda durante a concepção de Acatacara, tanto em reuniões internas dos Clowns quanto em encontros com Matías Maldonado, diretor do Teatro del Embuste, havendo um grande diálogo entre os processos de criação de ambas as obras. Em uma dessas conversas, Matías nos relatou sobre a existência de uma estação de trens desativada na periferia de Bogotá. As estátuas de Colombo e da Rainha Isabel, antes situadas em importantes pontos da capital colombiana, haviam sido levadas para aquela estação abandonada como medida preventiva para que não fossem “vandalizadas” pela população durante os protestos que agitavam a capital colombiana no período, convertendo a estação em um “cemitério de estátuas”, um cemitério de heróis caídos. A maneira como essa imagem ressoou em ambos os grupos, somada à consonância às questões que vínhamos pesquisando para a criação de Acatacara, fez com que determinássemos que a revisão histórica a partir da obsolescência de determinados marcos urbanos seria o mote inicial para a criação de As teias abertas da América Latina.
Apesar de o projeto inicial do espetáculo já prever algum tipo de comunicação virtual entre Natal e Bogotá, foi apenas após a experiência de Acatacara, que definimos adotar o WhatsApp como aplicativo base para As teias abertas... Para isso, criamos um grupo através dele, onde reunimos espectadores brasileiros e colombianos – e de outras quaisquer localidades. Lá foi tecida a linha dramatúrgica que entremeou materiais de diferentes naturezas (links, músicas, notícias, imagens etc[6]), e foram compartilhadas com o público virtual as transmissões ao vivo das intervenções cênicas realizadas presencialmente nos espaços urbanos de Natal e Bogotá, pelos Clowns e Teatro del Embuste, além das intervenções criadas pelos atores e atrizes convidados[7].
Difícil dizer em que momento exato do processo optamos pela criação de quatro atos, realizados um a cada dia de apresentação. Fato é que, alimentados pelas diferentes temáticas que emergiram da pesquisa conjunta entre os dois grupos, decidimos dividir a obra em quatro segmentos que abordaram respectivamente a precarização do trabalho e o continente latino-americano como mercadoria, o conceito de herói, e os apagamentos históricos tanto dos povos originários, quanto das mulheres. Apesar de termos iniciado a criação tendo como ponto de partida a investigação dos monumentos históricos de Natal e Bogotá, durante os ensaios nos demos conta de que, em Natal, a história oficial se vê plasmada de forma mais presente e cotidiana nos nomes de suas ruas e avenidas. Isso fez com que direcionássemos as intervenções cênicas natalenses para importantes cruzamentos da cidade que, de alguma forma, se vinculavam ao tema discutido em cada ato.
As teias abertas da América Latina surgiu num momento de transição no que tange tanto as medidas sanitárias relativas à pandemia, quanto a recepção do público ao teatro online. Com o retorno gradual à “normalidade”, começou a haver, por um lado, um desinteresse cada vez maior em relação ao teatro virtual e suas experimentações, realizadas à exaustão por quase dois anos ininterruptos de pandemia. Por outro, essa ideia de retorno às atividades presenciais – ainda mais por aqueles que, como nós, havíamos estado até muito pouco tempo em completo isolamento – parecia, como ainda aparece, envolto em muitos riscos com os quais precisávamos passar a lidar.
Como colocar esses corpos novamente em jogo, depois de tanto tempo parados, com a energia e a expansividade necessárias para uma ação no espaço urbano? Como garantir a saúde dos performers e do público em uma situação de nenhum controle sanitário possível, como a que estávamos nos propondo ao realizar as ações em esquinas movimentadas? Como incorporar equipamentos de proteção individual dentro da estética propostas para as intervenções? Como administrar – técnica e poeticamente – essas diferentes dramaturgias nessa encruzilhada de referências, países, línguas e pensamentos teatrais distintos espalhados pelo continente? Como transferir para as ruas a manipulação das tecnologias adquiridas nesse período? Como garantir que as intervenções fossem potentes e comunicassem ao público presencial de forma independente, mas mantivessem um diálogo entre si e com os demais materiais enviados pelo WhatsApp?

As teias abertas da América Latina. Ato I: esclavitud perpetua ou os escravagistas do século XXI não operam mais em navios negreiros | #ADnoTextoAlternativo #4ParedeParaTodes
Olhando em retrospecto, sinto que, durante a tarefa hercúlea que foi idealizar e realizar As teias abertas…, conseguimos encontrar respostas satisfatórias para algumas dessas questões, mas não para todas. É sobre esses pontos de incerteza e de reflexão que optei por me debruçar nos parágrafos seguintes.
Em nossas experiências virtuais prévias, havíamos prezado por manter uma relação direta com os espectadores, trazendo-os para o jogo e contando com sua participação como cocriadores da obra, sendo a interatividade um componente central dessas encenações. Porém, em As teias abertas… esse tipo de relação parece ter realmente se efetivado apenas no campo presencial, com os transeuntes e observadores das intervenções. As dificuldades enfrentadas ao administrarmos/realizarmos as duas intervenções urbanas em países distintos concomitantemente à comunicação com o público virtual via WhastApp, fizeram com que acabássemos por relegar aos espectadores virtuais a função de receptores de conteúdos com os quais não podiam, de fato, interagir.
Assim, a despeito de reiteradamente termos explorado diversas estratégias ao longo da pandemia para evitar a passividade (ou o desinteresse) por parte dos espectadores virtuais, é difícil afirmar que nesta primeira experiência híbrida[8] conseguimos gerar acontecimentos igualmente impactantes tanto para os espectadores presenciais quanto para os virtuais. Obviamente, trata-se aqui de um olhar subjetivo sobre possíveis resultados obtidos pela obra junto ao público, cabendo destacar que essa percepção parte de alguém que, durante as apresentações, esteve muito mais envolvido nas intervenções presenciais do que no manejo do conteúdo disponibilizado pelo WhatsApp. Por si só, esse fator pode aumentar minha sensação de disparidade em relação à apreensão da recepção das duas instâncias constituintes da obra – virtual e presencial.
Outro fator que se relaciona com essa mesma questão, mas sob outro viés, é aquele relativo à maneira escolhida para o acesso às intervenções pelo público virtual. Ainda movidos pela ideia original da criação de uma obra que ocorresse de maneira simultânea em Bogotá e Natal, optamos pela realização das intervenções durante as apresentações, transmitindo-as ao vivo pelo YouTube.
Existe uma força simbólica de irmandade no fato de que em um mesmo momento, em distintos pontos do continente, performers de diferentes países saiam às ruas de suas cidades para criar uma obra em comum.
Porém, por mais que possa ser interessante acompanhar a minúcia das intervenções minuto a minuto enquanto essas transcorrem, é praticamente impossível assegurar o engajamento e a atenção da maior parte do público virtual durante toda a realização das intervenções, ainda mais quando algumas delas constituem-se como performances de longa duração ou não possuem necessariamente um arco dramático. É difícil localizar com exatidão as motivações que levaram os grupos a optarem por esse formato de compartilhamento, mas tendo a pensar que elas passam menos por um preciosismo relacionado ao projeto inicial, e mais por uma dificuldade de pensar, durante o processo de criação, em outras soluções e operacionalizações possíveis dentro dessa instância híbrida ainda pouco explorada por ambos os coletivos coprodutores.
Tendo como exemplares os materiais desenvolvidos especialmente para As teias abertas… por Ana Correa, do Grupo Cultural Yuyachkani, e pelo Teatro de Los Andes, bem como alguns dos experimentos realizados pelos participantes do Laboratório de Demolição e Criação de Monumentos[9], identifico que seria mais significativo para o espectador virtual, nesse caso, o acesso às intervenções através de um vídeo editado de menor duração. Dentro da pesquisa que estávamos nos propondo, esses registros audiovisuais parecem ser mais efetivos do que as transmissões ao vivo por constituírem-se como obras artísticas autônomas nas quais os aspectos da linguagem audiovisual (qualidade de imagem, edição, adição de trilha sonora ou de outros materiais textuais etc.) tendem a favorecer a fruição dos [tele]espectadores ao gerar uma síntese e uma reelaboração do que foi experienciado nas intervenções presenciais.
Assim, caso tivéssemos optado pelo formato do compartilhamento das intervenções através de registros (e da criação de quatro ou oito produtos audiovisuais), além do aspecto de síntese sinalizado anteriormente, essa opção faria com que os elencos de ambos os grupos estivessem disponíveis para se dedicar à realização da dramaturgia da obra via Whatsapp em tempo presente, uma vez que as intervenções já teriam ocorrido anteriormente. Assim, teria sido possível a criação e operação de outros mecanismos de jogo por parte do elenco, a fim de valorizar o aspecto relacional com o público virtual, presente em todos os demais trabalhos desenvolvidos pelos Clowns nesse período.

As teias abertas da América Latina. Ato III: La pachamama ou esta terra tem dono | #ADnoTextoAlternativo #4ParedeParaTodes
Se levamos em consideração os últimos dois anos, os usos dados à virtualidade fizeram com que as noções de teatro e de território se expandissem, possibilitando criações compartilhadas em rede entre participantes de múltiplas localidades de maneira mais ágil e menos onerosa. As teias abertas da América Latina, cujo orçamento originalmente apresentado foi reduzido a quase metade quando de sua aprovação no Programa Iberescena, é uma prova viva disso. Porém, sinto que essa mesma condição de virtualidade acabou por minimizar em grande parte o grau de partilha e de contaminação entre os agentes criadores envolvidos na obra.
Quando levamos em conta as discussões, provocações, trocas de material produzidos e os planejamentos realizados conjuntamente através das reuniões por Zoom, e os comparamos com esses mesmos procedimentos sendo realizados em uma hipotética convivência presencial e diária, é possível compreender a perda implícita de potência de intercâmbio em uma coprodução em que não houve nenhuma etapa do processo de criação realizada em conjunto de modo presencial.[10] Mesmo sendo grupos que já se conheciam antes, que haviam trabalhado juntos por um curto período em 2019, e que nutrem uma admiração mútua, sinto que as intervenções resultantes de As teias abertas da América Latina acabaram por trazer pouco diálogo entre si, ficando cada qual pouco contaminada pelos preceitos, poética e linguagem que regem o grupo parceiro.
A título de exemplo, as intervenções realizadas pelos Clowns de Shakespeare foram todas realizadas pelas mesmas figuras, “seres-placas”, que no decorrer de cada ato além de apontar problemáticas diferentes no conteúdo exposto em suas placas principais, realizavam pequenas ações e evoluções no espaço tendo em vista destacar aspectos vinculados ao tema de cada ação. Já as intervenções realizadas pelo Teatro del Embuste foram calcadas em uma estrutura muito mais teatral e dramática, sendo compostas por dramaturgias que pressupunham distintos personagens a cada nova intervenção, operando mais fortemente dentro de uma chave de leitura representacional.
Apesar das problemáticas advindas desse processo, que pode ser compreendido como realmente um experimento de linguagem, o maior mérito de As teias abertas… reside no fato de demarcar a retomada do trabalho dos Clowns no espaço público, junto à comunidade, após dois anos de isolamento: poder sentir nos corpos as transformações geradas pelo convívio e pelo contato com o desconhecido é retomar parte do que nos constitui intrinsicamente como artistas da cena.
As teias abertas da América Latina demarca também de forma mais explícita o posicionamento político do grupo, e o desejo de propor diálogos com a cidade e seus habitantes de forma abrangente, propondo ações que se relacionem não apenas com o público habitual do coletivo, mas com uma gama mais ampla e mais diversa de cidadãos. Se a virtualidade foi um fator que facilitou o acesso à produção online criada durante a pandemia em várias partes do país e do mundo, é certo dizer que essa produção se restringiu ainda mais a um público que já frequentava espaços teatrais pré-pandemia. Isso faz com que nessa retomada pensemos ainda mais em estratégias que possam abranger esse público não-habitual do qual estivemos afastados não apenas nos últimos dois anos, mas particularmente neles.
Dezembro passou, e com a virada do ano, conhecemos a ômicron. Apesar dos altos índices de contágio e a volta de números na casa dos mil mortos por dia, a vida, inclusive a teatral, parece que seguirá tentando retomar à normalidade, em meio a cancelamentos, adiamentos e insegurança geral. Por ora, o teatro virtual parece ter sido um surto que se esgotou em si mesmo, com a fadiga causada pelo excesso de exposição às telas. Mesmo as ações pedagógicas virtuais parecem ter diminuído seu fôlego – desde 2015, esse é o primeiro ano que não realizamos nosso Laboratório da Cena, pois a proposta de um laboratório híbrido não teve o número de adeptos suficiente.
Correndo os riscos necessários, voltamos às salas de ensaio há cerca de um mês.
Na tentativa não de voltar a fazer o que fazíamos antes da pandemia, mas de verificar o que pode surgir das descobertas – e das perdas, e dos fracassos, e dos lutos – que acumulamos desde março de 2020.
Referências
Artigos e revistas
CLOWNS DE SHAKESPEARE. Almanaque da aventureira, aventureire e aventureiro mirim. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
_____. Revista Balaio. Natal, nº04, julho de 2016.
_____. Revista Balaio. Natal, nº05, abril de 2021. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
SPINELLI, Diogo. Laboratório da cena Clowns de Shakespeare e laboratório da cena de Parnamirim: experiências de formação em teatro de grupo. Disponível AQUI Acesso em fev. 2022
______. Interação, risco, jogo: princípios de equivalência no teatro expandido dos Clowns de Shakespeare. In: Subtexto – Revista de Teatro do Galpão Cine Horto. Belo Horizonte, nº16, dezembro de 2021. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
______. Teatro potiguar na pandemia: um ano e meio de teatro mediado por telas. Leia AQUI
_____. Teatros possíveis em meio a um apocalipse pandêmico ou Ajuste o seu dispositivo para o modo de exibição em galeria. In: Crítica em movimento: espaços digitais empenhados em artes cênicas. São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
YAMAMOTO, Fernando. Salvem os legumes! Ou para onde ecoa a cena virtual? In: Subtexto – Revista de Teatro do Galpão Cine Horto. Belo Horizonte, nº16, dezembro de 2021. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Vídeos
A Casa Inteira é um palco: o processo de construção de CLÃ_DESTIN@. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Abertura de Processos de Criação: As Telas Abertas da América Latina. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Em cada praça, o mundo. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Encontro aberto ao público com os participantes do Laboratório Demolição e Criação de Monumentos. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Laboratorio integral de demolición y creación de monumentos. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
O avesso do avesso: o processo por trás de Acatacara. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Podcasts
Acatacara. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
As teias abertas da América Latina. Disponível AQUI. Acesso em fev. 2022
Notas de Rodapé
[1] Para conhecer um pouco mais sobre ambos os projetos, recomendo a leitura da Revista Balaio número 04 e do artigo “Laboratório da Cena Clowns de Shakespeare e Laboratório da Cena de Parnamirim: experiências de formação em teatro de grupo”, de minha autoria, disponibilizado nas referências bibliográficas.
[2] Nesse projeto foram realizadas também nove entrevistas com importantes figuras da cultura e do teatro popular latino-americanos, denominados Conexões Tramas. Essas entrevistas estão disponíveis no canal de YouTube do grupo, bem como encontram-se transcritas, traduzidas e publicadas na Revista Balaio número 05, disponibilizada gratuitamente no site do grupo.
[3] Em janeiro de 2021 produzimos A Casa Inteira é um palco: o processo de construção de CLÃ_DESTIN@, espécie de desmontagem audiovisual deste espetáculo. O vídeo está disponível em nosso Youtube.
[4] Como material complementar ao espetáculo, desenvolvemos um almanaque com curiosidades e atividades relacionadas à América Latina, que era enviado aos espectadores anteriormente às sessões. O almanaque pode ser acessado através do link disponibilizado nas referências bibliográficas deste artigo. Para saber um pouco mais sobre essas duas primeiras obras, sugiro também a leitura do artigo “Interação, risco, jogo: princípios de equivalência no teatro expandido dos Clowns de Shakespeare”, de minha autoria, publicado na revista Subtexto.
[5] Para se aprofundar um pouco mais na experiência de Acatacara, sugiro a leitura do artigo “Salvem os legumes! Ou para onde ecoa a cena virtual?”, de Fernando Yamamoto, publicado na revista Subtexto. Também podem ser acessados no Spotify todos os podcasts constituintes da obra, bem como o bate-papo realizado com os participantes (integrantes do Clowns e público em geral) da experiência intitulado O avesso do avesso: o processo por trás de Acatacara, disponível em nosso canal de Youtube.
[6] Assim como em Acatacara, resolvemos realizar um podcast diferente para cada dia de apresentação de As teias abertas da América Latina. Os mesmos ainda podem ser acessados em nosso Spotify.
[7] Participaram do projeto como elenco convidado: Alice Padilha Guimarães – Teatro de los Andes (BO), Ana Correa – Yuyachkani (PE), Ana Julia Marko (USP/SP) e Gerson Guerra – Malayerba (EQ). Além dos convidados, tivemos também ao longo do processo de criação encontros com os seguintes provocadores: Arístides Vargas e Charo Francés – Malayerba (EQ), Augusto Casafranca – Yuyachkani (PE) e Gonzalo Callejas – Teatro de los Andes (BO).
[8] Interessante pensar que em 2019 realizamos em parceria com o Grupo Bagaceira (CE) uma série de intervenções urbanas nas praças de Natal e Fortaleza, chamadas de Ponto de Encontro, que ocorriam concomitantemente e em comunicação por lives realizadas nas praças. Apesar de ser um projeto pré-pandemia, na ocasião nossos trajes eram compostos por roupas, óculos e máscaras de proteção brancos, quase que prevendo as cenas que se desenrolaram na realidade em 2020. Podemos ver uma linha de continuidade entre os dois trabalhos – inclusive esteticamente – porém a grande diferença entre as duas experiências, e que expande ainda mais o caráter híbrido de As teias abertas, é justamente a pressuposição de uma camada de espectadores que teriam acesso à obra apenas de modo virtual, o que seria impensável pré-2020. Há um microdoc sobre Ponto de Encontro, chamado “Em cada praça, o mundo”, disponível em nosso canal no Vimeo.
[9] Dias antes de estrear As teias abertas da América Latina, pudemos ministrar, em conjunto com o Teatro del Embuste, a oficina denominada “Laboratório de Demolição e Criação de Monumentos”, dentro da programação da Ocupação Mirada 2021 do SESCSP. Na oficina, orientamos dez núcleos de artistas latino-americanos a desenvolverem intervenções urbanas em monumentos de suas respectivas cidades. Participaram desta ação artistas das cinco regiões do Brasil, além de Colômbia, Peru e Bolívia. Também compuseram parte da programação mesas abertas sobre o teatro latino-americano, que ainda se encontram disponíveis no YouTube do SESCSP.
[10] Para além das questões pandêmicas, a redução do orçamento original foi determinante para que não fossem realizadas etapas de trocas presenciais entre os grupos durante o processo de criação de As teias abertas da América Latina.