Festival Santiago a Mil
FESTIVAL SANTIAGO A MIL
Igor de Almeida Silva
Professor de teatro da UFPE
De acordo com Dicionário de Teatro, de Patrice Pavis (1999), um festival – cujo termo é “a forma adjetiva para festa” (1999, p. 166) – é um momento de suspensão do mundo do trabalho, privilegiado pelo encontro e pela celebração. Tem suas origens nos festivais cívico-religiosos de Atenas, cujo ciclo da natureza também possui marcante função em sua organização e no entusiasmo geral do público.
Em sua concepção moderna, um festival de teatro é, sobretudo, “uma enorme concentração de companhias e de experiências que procuram ao mesmo tempo ser reconhecidas pela crítica e pelo público” (1999, p. 166). Além disso, são muitas vezes possibilidades inéditas oferecidas a uma plateia local de assistir, em um tempo e espaço determinados, espetáculos marcantes, conhecer artistas e grupos teatrais, novas tendências ou experiências artísticas bastante distantes de suas referências habituais. É ao mesmo tempo, um momento de aprendizagem, de encontro e de prazer, pela própria natureza festiva de sua prática.
Na Europa, os festivais são bastante frequentes no verão, período reservado às férias, cujos mais famosos são o Festival de Edimburgo, no Reino Unido, e o Festival de Avignon, na França.
Na capital chilena, Santiago, cujo clima é mais próximo ao europeu, com estações do ano bastante demarcadas e inverno rigoroso, o Festival Internacional Santiago a Mil ocorre sempre na primeira metade do mês de janeiro, em pleno verão sul-americano, mantendo assim certa similaridade com os antecessores europeus.
O Festival inicia suas primeiras edições ainda na década de 1990, após longo período de regime ditatorial, que impõe ao Chile um intenso processo de reformulação cultural ao longo dos anos 1980.
Motivados pela criação de um novo espaço para as artes do espetáculo, as produtoras de teatro Carmen Romero e Evelyn Campbell decidem realizar a mostra Teatro a Mil, em 1994, realizada no Centro Cultural Estação Mapocho.
Ao longo dos anos, o Festival se estabelece como uma iniciativa poderosa, que se reflete no crescente sucesso de público, tornando-se, a partir de 2006, um festival internacional.
Nesta edição de 2015, que se realizou de 3 a 18 de janeiro, a programação ofereceu um cardápio variado de produções dos cinco continentes. Trata-se de tarefa inglória – para não dizer impossível – a tentativa de assistir a todos os espetáculos da programação, visto que houve de fato uma vasta oferta de produções, realizadas em espaços fechados e abertos, ao longo do dia e à noite, nos diversos segmentos e linguagens artísticas (teatro, dança, performance, música, espetáculos de rua, teatro infantil, etc), para todas as idades e gostos. Um festival múltiplo que se destaca no contexto latino-americano não pelo recorte curatorial, mas pela diversidade de produções e gêneros artísticos contemplados.
Nesse sentido, o Festival Santiago a Mil apresenta certa semelhança com o Festival de Edimburgo, não só pela enorme quantidade de espetáculos apresentados, mas, sobretudo, pela ausência de uma curadoria na seleção da mostra. Há espaço tanto para a cena contemporânea com artistas e grupos importantes, como o grupo suíço-alemão Rimini Protokoll (Remote Santiago) e o encenador e multiartista da África do Sul, Brett Bailey (Exhibit B), quanto para o espetáculo de dança flamenca Ay!
De todo modo, pela ampla esfera de artistas contemplados em sua mostra, o Festival Santiago a Mil não deixa de ser uma vitrine internacional importante do teatro mundial na América do Sul.
REFERÊNCIAS
PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. Trad. sob a direção de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: Perspectiva, 1999.